Não quero lhe falar, meu grande amor
De coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
A primeira estrofre não tem muito mistério. Aparentemente, o eu-lírico vai contar um relato de algo que aconteceu com ele, mas, como vemos ao longo da música, não vemos uma narrativa de um relato e sim algo parecido com um conselho que o eu-lírico quer passar com base na sua experiência de vida.
Viver é melhor que sonhar
E eu sei que o amor é uma coisa boa
Mas também sei que qualquer canto
É menor do que a vida de qualquer pessoa
Sabemos que em 1976 o Brasil ainda passava pela Ditadura Militar e durante aqueles últimos anos, a repressão era muito presente e muitas músicas foram censuradas e artistas, sobretudo cantores, foram perseguidos. Tendo isso como base, podemos supor que o eu-lírico é uma pessoa realista, que aceita a realidade do jeito que ela é, diferente dos revolucionários da época, que cantavam como protesto, por isso a ênfase em ''qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa''. Podemos ver que o eu-lírico não vê poder na música e defende que a vida de uma pessoa é mais importante, entrando em contraposição com muitos artistas. Além disso, é possível perceber que o eu-lírico é realista ao ponto de ser ''pé no chão'', porque acredita que, apesar de amor e sonho serem maravilhosos, viver o agora é o mais importante.
Por isso cuidado, meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal está fechado pra nós
Que somos jovens
Eis a reviravolta: o eu-lírico é jovem. Vemos aqui que é um jovem aconselhando jovens, é possível ver isso no final da estrofe, quando ele diz "que somos jovens". O eu-lírico é um jovem que já passou por muita coisa, por isso aconselha uma determinada pessoa a ter cuidado com o que fala, por onde anda, com quem anda e como age em público, porque, ainda considerando a ideia de que o eu-lírico é ''pé no chão'', ele prefere se manter seguro longe de protestos ou de atitudes comuns da juventude como sair na rua com os amigos. Em seguida ele faz uma afirmação, creditando vitória a ''eles'', que, provavelmente sejam os militares ou as pessoas contra os revolucionários opositores do regime vigente. E assim, o eu-lírico afirma que não adianta protestar ou apenas andar na rua por ser perigoso para a juventude devido às pessoas que a música chamou de ''eles''.
Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço
O seu lábio e a sua voz
Essa é uma das estrofres mais enigmáticas da música, mas, uma teoria é de que a estrofe está com a ordem das palavras invertidas, então, a princípio, seguindo a ordem direta das palavras, o eu-lírico diz que o braço, o lábio e a voz foram feitos para abraçar, beijar e dialogar. A relação que essa estrofe tem com o sentido da música pode estar ligada à opinião do eu-lírico. Para ele, os braços, os lábios e a voz foram feitas para demosntrar carinho e afeto e não para protestar ou brigar.
Você me pergunta pela minha paixão
Digo que estou encantada como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade, não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento cheiro de nova estação
Eu sinto tudo na ferida viva do meu coração
Já faz tempo, eu vi você na rua
Cabelo ao vento, gente jovem reunida
Na parede da memória
Essa lembrança é o quadro que dói mais
Aqui vemos um momento nostálgico do eu-lírico. Ele estaria falando com um outro jovem que faz tempo que o via, sentindo os cabelos ao vento, ao lado de outros jovens. Naquela época, era muito comum os jovens se reunirem para protestar e, considerando que o eu-lírico já não faz mais isso, sente nostalgia. Para ele, é uma lembrança dolorosa porque ele não faz mais parte desse grupo de jovens ou os jovens não saem mais na rua por causa do perigo que alertou nos versos anteriores.
Minha dor é perceber
Que apesar de termos feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais
Para mim, a autora, essa estrofe é a mais atemporal de toda a música porque ela não só combina com a temática da música, mas como também é uma reflexão para outros contextos sociais. Vemos aqui que o eu-lírico mostra o seu ponto de vista a respeito de tudo o que ele e a juventude fizeram. No caso, embora a juventude tente agir como tal, com pensamentos à frente, com a vontade de mudar o mundo e agir de forma contrária à geração anterior, para o eu-lírico, nós (a juventude) somos os mesmos que nossos pais (a geração anterior) e vivemos como eles.
Nossos ídolos ainda são os mesmos
E as aparências não enganam, não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém
A possível interpretação para essa estrofe é que a indústria cultural (de cinema e de música) tem uma fórmula para fazer com que um artista se torne famoso, então os ídolos não são literalmente os mesmos, mas se parecem muito e por isso as aparências não enganam. Depois o eu-lírico afirma que "você" diz que depois que esse ídolo fez sucesso, não apareceu mais ninguém que chegasse aos pés desse ídolo, mas, como havia dito anteriormente, as aparências não enganam, então será sempre os mesmos ídolos. Outra possibilidade é que "ídolos" não necessariamente é um cantor ou um ator, então "ídolos" pode ser uma metáfora para personalidades famosas que admiramos, como políticos, pintores, influenciadores de moda na época, personagens de desenho animado etc. Mas, levando em consideração que talvez a música tenha cunho político devido à época em que foi lançada, talvez "ídolos" tenha um foco um pouco maior em políticos e cantores.
Essa estrofre ressalta o que eu-lírico quis dizer com ''semos os mesmos e vivemos como nosos pais''.
Você pode até dizer que eu tô por fora
Ou então que eu tô inventando
Mas é você que ama o passado e que não vê
É você que ama o passado e que não vê
Que o novo sempre vem
Os dois primeiros versos dizem por si só, mas eles mostram o quanto o terceiro verso critica o "você" e o chama de alienado nas entrelinhas. Diz que o novo sempre vem. Basicamente é como se o eu-lírico dissesse "não se engane achando que você está procurando ser moderno! Você age como nossos pais e esquece de olhar para o futuro porque vive olhando para o passado sem ter noção disso".
Hoje eu sei que quem me deu a ideia
De uma nova consciência e juventude
Está em casa guardado por Deus
Contando o vil metal
Minha dor é perceber
Que apesar de termos feito tudo, tudo, tudo, tudo o que fizemos
Nós ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais
Concluindo com a repetição do refrão, o eu-lírico demonstra sua frustração com tudo aquilo que ele havia criticado anteiormente. Pode-se perceber isso na repetição da palavra ''tudo'', o que significa que, para ele, nada mudou e nada vai mudar.
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